‘As pessoas continuam com medo’, diz diretor de ‘Bandidos na TV’, série sobre Wallace Souza

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Entre os anos 1990 e a década passada, Wallace Souza foi o rei da televisão no Amazonas. Com o “Canal livre” , um programa sensacionalista local que explorava a violência urbana, o ex-policial convertido em apresentador chegou a liderar a audiência em sua faixa. Porém, o crime mais espetacular de Manaus não foi televisionado pela atração: em 2008, já eleito deputado estadual graças a sua fama, o apresentador foi acusado de encomendar assassinatos. O objetivo seria duplo: além das mortes ajudarem a atrair telespectadores para o “Canal livre”, seria também uma forma de eliminar inimigos da organização criminosa que Wallace comandaria . Uma década depois, a série documental“Bandidos na TV” , disponível na Netflix desde sexta-feira, recupera o caso e tenta resolver muitas das peças que ficaram soltas do quebra-cabeça desde que Wallace morreu em 2010, em consequência de um ataque cardíaco, e os processos penais contra ele foram suspensos. 

— Na época em que o caso surgiu, muita gente envolvida estava com medo de falar com a imprensa. Mas, agora, passaram-se muitos anos. Essas pessoas continuam com medo, mas explicamos qual era o nosso propósito e elas concordaram em colaborar — afirma o diretor Daniel Bogado . Ele conta que, em alguns casos, a equipe chegou a se encontrar até cinco vezes com os envolvidos antes de convencê-los a falar em vídeo. Entre os entrevistados, está a mulher do ex-policial militar Moacir Jorge , o Moa , que denunciou Wallace após ser preso, e um dos filhos do apresentador, Willace Souza . A equipe também conseguiu falar com um ex-funcionário do “Canal livre” que, após depor na época, entrou para o programa de proteção de testemunhas, e, no último episódio, leva novas informações sobre o que teria acontecido.

— Uma coisa que a série faz é que, quando você a assiste, quer discutir com alguém sobre se Wallace seria ou não culpado. E as pessoas assumem opiniões muito fortes sobre isso — defende o diretor.

Britânico de origem paraguaia, Bogado é um documentarista experiente, com trabalhos anteriores dedicados ao conflito no Sudão do Sul e ao grupo terrorista nigeriano Boko Haram. Ele conheceu a história de Wallace quando o caso repercutir na imprensa internacional, após reportagens do “Fantástico”, da TV Globo.

— Por um ou dois dias, foi uma história internacional. Depois, a notícia desapareceu. Mas aquilo me chamou muita atenção e eu nunca esqueci.

Após perceber que ninguém mais tinha retornado ao caso,Bogado viajou a Manaus pela primeira vez em 2017, para fazer uma pesquisa preliminar. Depois, conseguiu convencer a Netflix a produzir o projeto. Nos últimos anos, a plataforma de streaming tem investido pesadamente em docusséries sobre crimes reais , como “Making a murderer”, “Wild wild country” e “Gênio diabólico”. É a primeira vez, no entanto, que a empresa se dedica a uma história brasileira (que ganhou legendas em 27 línguas diferentes).

Para Bogado, a história de Wallace e do Canal Livre tem apelo global “em diferentes níveis”.

— Se eu digo que é sobre um homem que matou para ter audiência na TV, não importa a nacionalidade, as pessoas estão automaticamente interessadas em saber mais. Mas é também sobre família, política e sobre a cidade de Manaus. De certa forma, a história do Amazonas nos últimos vinte anos é contada através do caso.


Fonte: O Globo

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